A pacificação de favelas no Rio está valorizando os bairros
próximos das comunidades e abrindo um novo mercado para construtoras e
incorporadoras
Por Pâmela Reis
Policiais hasteiam bandeira no Morro do Alemão: ocupação das favelas valorizou imóveis da região |
Elemento
fundamental para a retomada do Rio de Janeiro como centro das atenções foi o
projeto de instalação de UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) nas favelas,
coordenado pela Secretaria de Segurança do Estado. A ocupação dos morros pelas
forças de segurança, seguida da instalação de unidades fixas da Polícia Militar,
amenizou um dos principais problemas da cidade - a violência potencializada pela
guerra do tráfico - e despertou o interesse dos cariocas por regiões adjacentes
às favelas, antes desprezadas devido aos altos índices de
criminalidade.
A
primeira pacificação aconteceu em novembro de 2008, com a ocupação do morro
Santa Marta, no Botafogo. O vice-presidente do Secovi-Rio (Sindicato da
Habitação), Leonardo Schneider, morou na região e conta que aquela comunidade
era conhecida por tiroteios recorrentes e pela ameaça das balas perdidas. "O
fundo do meu prédio dava de frente para o morro. Embora houvesse uma distância
de cerca de 2 km, ninguém queria comprar apartamento ali. As unidades dos fundos
eram 30% mais baratas que as da frente", relata. Schneider conta que após a
pacificação os preços se nivelaram e o mercado imobiliário da região se
revigorou.
Um levantamento feito pelo Secovi-Rio mostra que, entre abril de 2006 e dezembro de 2008, a valorização dos apartamentos de dois quartos no Botafogo foi de apenas 24,95%, enquanto de 2008 a agosto de 2011 o preços subiram 105,32% e chegaram à média de R$ 676 mil. Com o sucesso da primeira experiência, a pacificação seguiu por outras comunidades da zona Sul, sempre com efeitos positivos sobre os preços dos imóveis ao redor, principalmente nas ruas mais próximas à favela. O Secovi acompanhou as primeiras ocupações e calculou uma valorização média de 30% a 40% nos bairros vizinhos.
Empreendimento residencial da Calçada, na Tijuca, foi vendido por R$ 6,5 mil o metro quadrado por conta da valorização depois da instalação das UPPs |
Recuperação na zona
Norte
A zona
Sul, no entanto, talvez não seja o melhor exemplo deste fenômeno, já que os
preços da região também são fortemente pressionados pela escassez de terrenos e
pela demanda acirrada. Os efeitos se tornaram mais nítidos a partir do momento
em que as UPPs entraram nas favelas da zona Norte, em regiões que há muito tempo
estavam fora do radar das incorporadoras. "Ali, a UPP foi fundamental para o
resgate de bairros e ruas que estavam degradados, esquecidos e sem nenhuma
liquidez para transações imobiliárias", diz Leonardo Schneider.
O caso
mais emblemático é o da Tijuca, uma área cercada por morros que foi se
desvalorizando progressivamente com a escalada da violência no Rio. "A Tijuca é
um bairro muito tradicional que foi ocupado por uma elite no passado. As pessoas
que moram ali não querem sair, mas estavam sendo obrigadas a deixar a região por
força da violência", conta Luiz Henrique Rimes, diretor nacional de negócios da
João Fortes Engenharia. A situação se reverteu a partir de 2010, quando uma
série de comunidades que rodeiam a Tijuca foram pacificadas - Salgueiro,
Formiga, Boréu, Andaraí, Turano, Macacos e Mangueira -, transformando-a
novamente num polo de atração de investimentos imobiliários.
"Se antes o bairro estava degradado, com o comércio ameaçado e os shoppings enfraquecidos, a pacificação mudou completamente essa realidade e já existem muitas incorporadoras lançando empreendimentos ali. A Tijuca vive hoje um resgate de tradições", comenta Schneider. Para se ter ideia, em 2008 o metro quadrado residencial na Tijuca girava em torno de R$ 2 mil, enquanto no Recreio dos Bandeirantes os valores estavam na casa dos R$ 3 mil. Desde então, o imóvel na Tijuca se valorizou 161,4%, com destaque para o período pós-2010, e os preços praticamente se equipararam aos do Recreio, onde a variação foi de 70,1% no mesmo intervalo. Hoje, a média do metro quadrado é de R$ 5,3 mil no Recreio e de R$ 5,1 mil na Tijuca. Os dados são da Zap Imóveis.
De olho
no potencial do bairro, a Calçada lançou em 2010 o Florença Residences, com
apartamentos de três e quatro quartos, vendidos a R$ 5,5 mil o metro quadrado.
Um ano depois, a empresa lançaria outro residencial no terreno ao lado, o
Atrium, com apartamentos de mesma tipologia e mais 37 lofts instalados num
prédio retrofitado. O preço médio foi de R$ 6,5 mil o metro quadrado. "Sem a UPP
provavelmente não lançaríamos estes empreendimentos, e mesmo que tivéssemos
lançado, eles não teriam os preços de venda que alcançamos", comenta João Paulo
Matos, presidente da Calçada.
A Even
também colocou a Tijuca na mira de investimentos após as UPPs e já tem um
empreendimento comercial em aprovação para ser lançado em breve. Os
especialistas são unânimes em reconhecer que dificilmente a Tijuca voltará a ser
uma opção para a classe alta, mas a área já se consolida como uma importante
região de classe média, com o benefício de não sofrer com a saturação observada
na zona Sul.
Na
lista das ocupações mais recentes que aconteceram no Rio de Janeiro estão as do
morro do Vidigal e da favela da Rocinha, a mais famosa da cidade. As duas
intervenções, realizadas no início de novembro de 2011, afetaram diretamente o
bairro de São Conrado, região de praia localizada no meio do caminho entre o
Leblon e a Barra da Tijuca. "São Conrado sempre foi uma área nobre, mas ficou
muito degradado pela violência na década de 1990. Agora a região volta com força
total e acredito que será o terceiro bairro do Rio em preços, logo atrás de
Leblon e Ipanema", diz Schneider.
Pelos
números da Zap Imóveis, São Conrado surpreende. De 2008 a 2011 o preço médio do
metro quadrado subiu 137%, saltando da faixa de R$ 4 mil para R$ 9,6 mil. Para
efeito de comparação, o preço na Barra em dezembro de 2011 estava em torno de R$
7 mil, em Ipanema R$ 12 mil e no Leblon R$ 12,6 mil. O primeiro empreendimento a
se beneficiar dessa valorização foi o residencial Vintage Way, lançado pela João
Fortes Engenharia poucas semanas depois da ocupação das duas favelas. Segundo
Luiz Rimes, diretor da incorporadora, o preço médio de vendas foi de R$ 8,9
mil/m2 e as unidades esgotaram em duas semanas.
"A
proximidade com a data da pacificação foi uma coincidência, porque o lançamento
já estava programado e obviamente ninguém sabia da ocupação. Mas o perfil de São
Conrado já vinha mudando há mais de um ano. Quando as UPPs começaram, todo mundo
imaginava que haveria uma unidade na Rocinha, e os preços começaram a subir",
diz Rimes. O discurso do dirigente é confirmado pela curva do gráfico em
destaque. "Este processo de pacificação está acontecendo de maneira geral no
Rio, até na mentalidade das pessoas, que já não têm tanto medo das favelas",
afirma.
Outra
grande operação aconteceu no Complexo do Alemão, ocupado pelo exército no final
de novembro de 2011. João Paulo Matos afirma que o efeito desta pacificação já
pode ser sentido e deve surtir frutos em breve. "A ocupação do morro do Alemão
fez com que a Penha começasse a receber novos estudos e aquisições de terrenos,
e em breve devemos ter lançamentos na região", antecipa o presidente da Calçada.
Obviamente, o fenômeno não se
restringe aos bairros próximos de favelas: o mesmo efeito pode ser visto no
comércio informal dentro das comunidades. Segundo conta Leonardo Schneider, do
Secovi, um imóvel que estava sendo vendido a R$ 15 mil antes da ocupação do
Complexo do Alemão saltou para R$ 22,5 mil apenas dois dias depois da chegada do
exército. A pacificação também tem motivado o poder público a estudar melhorias
nos serviços básicos, como saneamento básico e distribuição de energia elétrica
nas favelas.
Hoje já
são 18 UPPs instaladas e mais quatro favelas ocupadas ainda sem a estrutura fixa
(veja detalhes no mapa). A meta da Secretaria de Segurança do Estado do
Rio é instalar 40 UPPs até 2014, ano de realização da Copa do Mundo, mas por
razões estratégicas o cronograma das operações não é divulgado pelo
governo.
Pacificação e valorização
O mapa mostra a localização das comunidades pacificadas do
Rio de Janeiro e a valorização imobiliária registrada pelo Secovi-Rio para
imóveis residenciais de dois quartos, antes e depois da ocupação
Fonte: Secovi-Rio |
The Pacification Effects
A fundamental element for the
return of Rio de Janeiro as the spotlight was the project to install UPPs
(Unidades de Polícia Pacificadora) (Pacifying Police Units) in the slums,
coordinated by the Department of State Security. The occupation of the hills by
the security forces, followed by the installation of fixed units of the Military
Police, softened one of the main problems of the city - the violence fueled by
the drug war - and captured the interest of the locals (cariocas) in areas
adjacent to the slums.
The most emblematic case is that of
Tijuca, an area surrounded by hills that was depreciating progressively with the
escalating violence in Rio. The situation was reversed from 2010, when a number
of communities surrounding the Tijuca were pacified, transforming it again in a
magnet for real estate investment. To get an idea, in 2008 the residential
square meter in Tijuca was around R$ 2 thousand, while in Recreio dos
Bandeirantes values were around R$ 3 thousand. Since then, the property in
Tijuca was appreciated by 161.4%. Today, the average square foot is R$ 5.3
thousand in Recreio and R$ 5.1 thousand in Tijuca.
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