Em um ano, ações de expropriações subiram 20% e já representam quase dois terços dos processos judiciais nas obras de infraestrutura.
Renée Pereira, de O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - As desapropriações de terras e imóveis turbinaram o volume de
ações judiciais contra obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) nos
últimos meses. Até junho do ano passado, os processos de expropriação
representavam 42% do total de questionamentos na Justiça. De lá pra cá,
cresceram 20% e já respondem por quase dois terços das ações envolvendo
empreendimentos de infraestrutura - uma das principais apostas da presidente
Dilma Rousseff para amenizar os impactos da crise mundial no Brasil.
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No total, as 20 mil obras do PAC enfrentam 8.609 processos, sendo 5.405
referentes às desapropriações, conforme levantamento feito pela Advocacia-Geral
da União (AGU) a pedido do Estado. Na média, significaria dizer que, para cada
dois empreendimentos do programa, uma ação é impetrada na Justiça. Entre as
obras com maior número de processos estão as de recursos hídricos, habitação,
saneamento, rodovia e aeroportos. Coincidentemente, são as que mais têm exigido
desapropriação de terras.
A procuradora da AGU, Patrícia Patrício, pondera que o aumento do número de
ações judiciais de desapropriação faz parte de uma atuação mais proativa do
governo federal para permitir a instalação dos empreendimentos. Mas basta dar
uma conferida nos relatórios do PAC para perceber que algumas obras ainda não
foram iniciadas por dificuldade na desapropriação. É o caso de um lote da BR-365
(MG), previsto para ser concluído em 2009 e que até agora não saiu do papel. No
último balanço, a obra estava parada por falta de desapropriação de imóveis no
perímetro urbano.
Pela lei, a tomada de posse de uma propriedade é simples. Mas, na prática, o
processo pode ser bastante complexo. O primeiro passo é fazer a declaração de
utilidade pública da terra.
Depois, há dois caminhos: administrativo ou judicial, explica Ventura Alonso
Pires, advogado especialista em desapropriação e sócio da Pires e Associados. No
primeiro caso, as duas partes negociam o valor da terra e fecham um acordo
amigável.
Já na segunda hipótese, diz ele, o governo entra com a ação na Justiça e faz
a oferta para o imóvel. O juiz avalia o valor e decide se concede ou não a
liminar. Para tomar posse, o governo só tem de fazer o depósito do valor
estabelecido. A partir daí, já pode iniciar as obras. "Ao expropriado, resta
questionar na Justiça o valor a receber, já que a desapropriação é prerrogativa
do Estado", diz o advogado Robertson Emerenciano, sócio do Emerenciano, Baggio e
Associados.
Sendo assim, a pergunta é: por que há tanta demora nos processos conduzidos
pelo governo? Os especialistas têm na ponta da língua uma lista de entraves. Um
deles é o já conhecido problema de gestão dos governos federal, estadual e
municipal. Na maioria das vezes, o governo se enrola na própria burocracia e não
consegue dar celeridade ao processo, explicam especialistas.
O outro obstáculo é orçamentário. "Temos casos no escritório em que uma
autarquia estadual teve o laudo provisório aprovado pelo juiz, mas não depositou
o valor do terreno. Nessa situação, o bem fica fora do mercado e o proprietário
não consegue fazer nada com o imóvel", diz Pires. Do outro lado, sem o
pagamento, o governo não pode iniciar a obra.
A advogada da União Quésia Maria Mendes Neiva destaca que o juiz também pode
decidir por não conceder a liminar ao governo - o que é menos comum. Nesse caso,
não é possível ter a posse do imóvel. "Estou com um caso na Ferrovia Norte-Sul
(cujas obras já duram décadas) em que o juiz não reconhece que a Valec (estatal
ferroviária) tenha legitimidade para fazer a desapropriação das terras."
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