Patrícia Benvenuti
da Redação
Greves em grandes obras mostram força dos trabalhadores da indústria da construção frente à superexploração imposta pelas empreiteiras.
Nas arenas
Nos estádios da Copa, a insatisfação também predomina. Dos 12 estádios que sediarão as partidas, oito já tiveram greves, somando pouco mais de 90 dias de paralisação.
O Maracanã, no Rio de Janeiro, foi o estádio que mais teve dias parados, 24 no total. Em agosto do ano passado, os trabalhadores que realizam a reforma do estádio paralisaram as atividades depois da explosão de um tonel com produtos inflamáveis que feriu o ajudante de produção Carlos Felipe da Silva Pereira. Em setembro, uma nova greve foi deflagrada depois de os operários receberem comida estragada.
Obras do Maracanã, no Rio de Janeiro
Foto: Rogério Santana/Governo RJ
Outra greve que ganhou destaque foi a da Arena Pernambuco, em fevereiro deste ano. A paralisação, que durou oito dias, reivindicava benefícios como aumento do valor da cesta básica de R$ 80 para R$ 120, plano de saúde para os trabalhadores e abono dos dias parados. Em vez de demandas atendidas, o resultado foi a demissão de 300 homens da obra.
Relação
Melhores salários, plano de saúde, alimentação e alojamentos adequados. Além de uma pauta de reivindicações semelhante, o principal elo entre todas essas mobilizações, destaca o professor de Ciência Política da Universidade do Estado da Bahia, Milton Pinheiro, é que todas ocorrem no âmbito da construção, um dos setores que mais cresce e recebe incentivos públicos hoje. Ao mesmo tempo, um segmento comandado por um grupo de empreiteiras que tem se caracterizado pelas más condições que oferecem a seus trabalhadores. “Surge uma grande manifestação em contrapartida àquele polo que hoje está adquirindo e ganhando recursos fenomenais do poder público para destravar o capitalismo no Brasil pelas obras de infraestrutura”, afirma. Também chama a atenção o
fato de as greves ocorrerem de forma espontânea, que eclodem sobretudo pela precariedade extrema.
“A matriz [das greves] é a falta de respeito do governo e dos empresários em relação ao trabalhador, que fica em uma posição de escravo-livre, é uma nova forma de escravidão”, afirma o integrante da Executiva da Federação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada (Fenatracop), ligada à Força Sindical, Bebeto Galvão.
Irresponsabilidade
Mais grave, para o sociólogo e professor da Universidade Federal de Rondônia Luis Fernando Novoa, é o fato de a quase totalidade dessas obras serem financiadas pelo BNDES que, em suas diretivas, vincula os empréstimos ao cumprimento de condicionantes sociotrabalhistas. Em caso de descumprimento, lembra, a instituição poderá até mesmo cancelar os empréstimos. Entretanto, nada disso se verifica hoje.
“Há um aparato normativo que daria conta dessa situação para não dar prejuízo para os trabalhadores, mas o que estamos vendo é um relaxamento na aplicação e implementação dessas normas”, afirma.
O resultado, segundo ele, é a liberdade das empresas para imporem um padrão de superexploração. Nesse sentido, aponta, um dos principais responsáveis pela situação é o governo federal, na medida em que não toma medidas efetivas em favor dos trabalhadores. Na avaliação do sociólogo, o governo tem se apresentado apenas em momentos mais críticos das negociações, em mesas que resultam na concessão de benefícios pontuais.
“É uma postura de administração de um processo selvagem de exploração, e não um enfrentamento. O governo se mostra refém das grandes empresas na condução de um programa [PAC] que diz ser seu”, afirma.
Novoa também destaca a contradição que se revela nessas grandes obras. Enquanto por um lado há a defesa dos megaprojetos e megaeventos como alavancas para o desenvolvimento nacional, por outro os próprios operários desses empreendimentos e as comunidades afetadas dos entornos não possuem condições estruturais mínimas.
“Não dá para entender por que os trabalhadores e as populações locais não fazem parte do tal interesse nacional”, pontua.
O vice-presidente da Confederação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores nas Indústrias da Construção e da Madeira filiados à CUT (Conticom), Claudio da Silva Gomes, coloca a necessidade de se criar um acordo coletivo. Isso serviria para garantir, ao menos, piso e benefícios iguais em todo o país, já que uma das principais reclamações hoje é em relação às diferenças salariais entre os estados.
Se não houver medidas nesse sentido, assegura Gomes, as revoltas só tendem a se
repetir. “O trabalhador só vai ver e reconhecer quando as coisas, de fato, estiverem acontecendo”, garante.
Em 1º de março, a presidenta Dilma Rousseff assinou o Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Indústria da Construção Civil. O documento, entretanto, depende da adesão das empresas.
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